A Internet é um buffet infinito de vídeos de gatos, TV e Instagrams de
celebridades. Mas ela também pode estar aos poucos levando você à beira
da insanidade. E não estamos aqui usando nenhuma figura de linguagem.
À
medida que a Internet evoluiu para ser onipresente da vida moderna,
testemunhamos o aumento de uma série de transtornos mentais distintos
ligados diretamente ao uso da tecnologia digital. Até recentemente,
esses problemas, amenos ou destrutivos, não tinham sido reconhecidos
oficialmente pela comunidade médica.
Algumas dessas desordens
são novas versões de aflições antigas, renovadas pela era da banda larga
móvel, enquanto outras são criaturas completamente novas. Não fique
surpreso se você sentir uma pontinha de – pelo menos – uma ou duas
delas.
Nomophobia - O que é: a ansiedade que surge por não ter
acesso a um dispositivo móvel. O termo “Nomophobia” é uma abreviatura
de “no-mobile phobia” (medo de ficar sem telefone móvel).
Sabe
aquela horrível sensação de estar desconectado quando acaba a bateria
do seu celular e não há tomada elétrica disponível? Para alguns de nós,
há um caminho neural que associa diretamente essa sensação
desconfortável de privação tecnológica a um tremendo ataque de
ansiedade.
A nomophobia é o aumento acentuado da ansiedade que
algumas pessoas sentem quando são separadas de seus telefones. E não se
engane, pois não se trata de um #FirstWorldProblem (problema de
primeiro mundo). O distúrbio pode ter efeitos negativos muito reais na
vida das pessoas no mundo todo. E é mais intenso nos heavy users de
dispositivos móveis
Tanto que essa condição encontrou seu
caminho na mais recente edição do Diagnostic and Statistical Manual of
Mental Disorders (DSM-5, ou Manual Diagnóstico e Estatístico de
Distúrbios Mentais) e levou a um programa de tratamento dedicado à
Nomophobia no Centro de Recuperação Morningside em Newport Beach,
Califórnia.
“Estamos condicionados a prestar atenção às
notificações dos nossos telefones”, disse Rosen. “Somos como os cães de
Pavlov, de certa forma. Você vê as pessoas pegarem seus celulares e dois
minutos depois fazerem a mesma coisa, mesmo que nada tenha ocorrido.
Isso é impulsionado pela ação reflexa, bem como pela ansiedade para se
certificar de que não ter perdido nada. É tudo parte da reação FOMO
(Fear Of Missing Out, ou medo de estar perdendo algo).”
Síndrome do toque fantasma - O que é: quando o seu cérebro faz com que
você pense que seu celular está vibrando no seu bolso (ou bolsa, se você
preferir).
Alguma vez você já tirou o telefone do bolso
porque o sentiu tocar e percebeu depois que ele estava no silencioso o
tempo todo? E, ainda mais estranho, ele nem estava no seu bolso para
começo de conversa? Você pode estar delirando um pouco, mas não está
sozinho.
Segundo o Dr. Larry Rosen, autor do livro iDisorder,
70% dos heavy users (usuários intensivos) de dispositivos móveis já
relataram ter experimentado o telefone tocando ou vibrando mesmo sem ter
recebido nenhuma ligação. Tudo graças a mecanismos de resposta perdidos
em nossos cérebros.
“Provavelmente sempre sentimos um leve
formigamento no nosso bolso. Há algumas décadas nós teríamos apenas
assumido que isso era uma leve coceira e teríamos coçado”, diz Rosen em
entrevista ao TechHive.
“Mas agora, nós configuramos o nosso
mundo social para girar em torno dessa pequena caixa em nosso bolso.
Então, sempre que sentimos um formigamento, recebemos uma explosão de
neurotransmissores do nosso cérebro que podem causar tanto ansiedade
quanto prazer e nos preparam para agir. Mas ao invés de achar que é uma
coceira, reagimos como se fosse o telefone que temos que atender
prontamente”, completa.
No futuro, com a computação vestível,
há o risco da doença evoluir para novas formas, como, por exemplo,
usuários de Google Glass começarem a ver coisas que não existem porque
seu cérebro está ligado a sinais típicos do aparelho.
Náusea
Digital (Cybersickness) - O que é: a desorientação e vertigem que
algumas pessoas sentem quando interagem com determinados ambientes
digitais.
A última versão do iOS, sistema operacional móvel da
Apple, é uma reivenção plana, versátil e bonita da interface do usuário
móvel. Infelizmente, ela também faz as pessoas vomitarem e forneceu o
mais recente exemplo da doença.
Assim que a nova versão do iOS
foi liberada para os usuários de iPhone e iPad no mês passado, os
fóruns de suporte da Apple começaram a encher com reclamações de pessoas
que sentem desorientação e náuseas depois de usar a nova interface.
Isso tem sido atribuído em grande parte ao efeito que faz com que os
ícones e a tela de abertura pareçam estar se movendo dentro de um mundo
tridimensional abaixo do visor de vidro.
Essas tonturas e
náuseas resultantes de um ambiente virtual foram apelidadas de
ciberdoença. O termo surgiu na década de 1990 para descrever a sensação
de desorientação vivida por usuários iniciais de sistemas de realidade
virtual.
É basicamente o nosso cérebro sendo enganado e
ficando enjoado por conta da sensação de movimento quando não estamos
realmente nos movimentando.
Depressão de Facebook - O que é: a depressão causada por interações sociais (ou a falta de) no Facebook.
Os seres humanos são criaturas sociais. Então você pode pensar que o
aumento da comunicação facilitada pelas mídias sociais faria todos nós
mais felizes e mais contentes. Na verdade, o oposto é que parece ser
verdade.
Um estudo da Universidade de Michigan mostra que o
grau de depressão entre jovens corresponde diretamente ao montante de
tempo que eles gastam no Facebook.
Uma possível razão é que as
pessoas tendem a postar apenas as boas notícias sobre eles mesmos na
rede social: férias, promoções, fotos de festas, etc. Então é super
fácil cair na falsa crença de que todos estão vivendo vidas muito mais
felizes e bem-sucedidas que você (quando isso pode não ser o caso).
Tenha em mente que esse crescimento da interação das mídias sociais não tem que levar ao desespero.
O Dr. Rosen também conduziu um estudo sobre o estado emocional dos
usuários do Facebook e identificou que, enquanto realmente há uma
relação entre o uso do Facebook e problemas emocionais como depressão,
os usuários que possuem um grande número de amigos na rede social
mostraram ter menor incidência de tensão emocional.
Isso é
particularmente verdade quando o uso da mídia social é combinado com
outras formas de comunicação, como falar ao telefone.
Moral da história: 1) não acredite em tudo o que seus amigos postam no Facebook e 2) pegue o telefone de vez em quando.
Transtorno de Dependência da Internet - O que é: uma vontade constante e não saudável de acessar à Internet.
O Transtorno de Dependência da Internet (por vezes referido como Uso
Problemático da Internet) é o uso excessivo e irracional da Internet que
interfere na vida cotidiana. Os termos “dependência” e “transtorno” são
um pouco controversos na comunidade médica, já que a utilização
compulsiva da Internet é vista frequentemente como sintoma de um
problema maior, em vez de ser considerada a própria doença.
“Diagnósticos duplos fazem parte de tratamentos, de modo que o problema
está associado a outras doenças, como depressão, TOC, Transtorno de
Déficit de Atenção e ansiedade social”, diz a Dra. Kimberly Young. A
médica é responsável pelo Centro de Dependência da Internet, que trata
de inúmeras formas de dependência à rede, como o vício de jogos online e
jogos de azar, e vício em cibersexo.
Além disso, ela
identificou que formas de vício de Internet geralmente podem ser
atribuídas a “baixa autoestima, baixa autossuficiência e habilidades
ruins”.
Vício de jogos online - O que é: uma necessidade não saudável de acessar jogos multiplayer online.
De acordo com um estudo de 2010 financiado pelo governo da Coreia do
Sul, cerca de 18% da população com idades entre 9 e 39 anos sofrem de
dependência de jogos online. O país inclusive promulgou uma lei chamada
“Lei Cinderela”, que corta o acesso a games online entre a meia-noite e
às 6 da manhã para usuários com menos de 16 anos em todo o país.
Embora existam poucas estatísticas confiáveis sobre o vício em
videogames nos Estados Unidos, o número de grupos de ajuda online
especificamente destinados a essa aflição aumentou nos últimos anos.
Exemplos incluem o Centro para Viciados em Jogos Online e o Online
Gamers Anonymous, que formou o seu próprio programa de recuperação de 12
passos.
Embora a atual edição do Diagnostic and Statistical
Manual of Mental Disorders não reconheça o vício em jogos online como um
transtorno único, a Associação Psiquiátrica Americana decidiu incluí-lo
em seu índice (ou seção III), o que significa que estará sujeito a mais
pesquisa e pode eventualmente ser incluído junto a outras dependências
não baseadas em substâncias químicas, como o vício em jogos de azar.
“Quando você é dependente de algo, seu cérebro basicamente está
informando que precisa de certas substâncias neurotransmissoras,
particularmente a dopamina e a serotonina, para se sentir bem”, diz o
Dr. Rosen. “O cérebro aprende rapidamente que certas atividades vão
liberar essas substâncias químicas.
Se você é um viciado em
jogos de azar, tal atividade é o jogo. Se você é um viciado em jogos
online, então a atividade é jogar vídeogames. E a necessidade de receber
os neurotransmissores exige que você faça repetidamente a atividade
para se sentir bem.”
Cibercondria, ou hipocondria digital - O que é: a tendência de acreditar que você tem doenças sobre as quais leu online.
O corpo humano é um magnífico apanhado de surpresas que constantemente
nos presenteia com dores misteriosas, aflições e pequenos inchaços que
não estavam ali da última vez que verificamos. Na maioria das vezes,
essas pequenas anormalidades não dão em nada.
Mas os vastos
arquivos de literatura médica disponíveis online permitem que a nossa
imaginação corra solta em todos os tipos de pesadelos médicos!
Teve uma dor de cabeça? Provavelmente não é nada. Mas, de novo, a WebMD
diz que essas dores de cabeça são um dos sintomas de tumor no cérebro.
Há uma chance de você morrer muito em breve! É esse o tipo de pensamento
que passa pela cabeça de um cibercondríaco – que juntam fatores médicos
para chegar às piores conclusões possíveis.
E isso está longe
de ser incomum. Em 2008, um estudo da Microsoft descobriu que
autodiagnósticos feitos a partir de ferramentas de busca online
geralmente levam os “buscadores aflitos” a concluir o pior.
A
hipocondria sempre existiu, claro, mas antes as pessoas não tinham a
Internet para ajudar a pesquisar informações médicas às três da manhã. A
cibercondria é apenas uma hipocondria com conexão banda larga.
“A Internet pode exarcebar os sentimentos existentes de hipocondria e,
em alguns casos, causar novas ansiedades. Porque há muita informação
médica lá fora, e algumas são reais e válidas e outras contraditórias”,
disse o Dr. Rosen. “Mas, na Internet, a maioria das pessoas não pratica a
leitura literal da informação.
Você pode encontrar uma
maneira de transformar qualquer sintoma em milhares de doenças
terríveis. Você alimenta essa sensação de que está ficando doente.”
O efeito Google - O que é: a tendência do cérebro humano de reter menos
informação porque ele sabe que as respostas estão ao alcance de alguns
cliques.
Graças à Internet, um indivíduo pode facilmente
acessar quase toda a informação que a civilização armazenou ao longo de
toda sua vida. Acontece que essa vantagem acabou alterando a forma como
nosso cérebro funciona.
Identificada algumas vezes como “The
Google Effect” (ou efeito Google) as pesquisas mostram que o acesso
ilimitado à informação faz com que nossos cérebros retenham menos
informações. Ficamos preguiçosos. Em algum lugar do nosso cérebro está o
pensamento “eu não preciso memorizar isso porque posso achar no Google
mais tarde”.
Segundo o Dr. Rosen, o Efeito Google não é
necessariamente uma coisa ruim. Ele poderia ser visto como o marco de
uma mudança social, uma evolução que apontaria para o nascimento de uma
população mais esperta e mais informada.
Mas também é
possível, admite ele, que tenha resultados negativos em certas
situações. Por exemplo, um jovem adolescente não memorizar a matéria das
provas porque ele sabe que a informação estará no Google quando ele
precisar, diz o médico.
Fonte: Pragmatismo Politico
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